terça-feira, 8 de setembro de 2015

Virar gente

                                                              Virar gente




  Eu amo chocolate, amo animais e tenho a mesma loucura (aceitável) que a grande maioria das pessoas tem de perder a noção de idade quando está perto de plástico-bolha. Perfeitamente normal as pessoas gostarem dessas coisas. E é até compreensível quando alguém fala: “Chocolate é melhor que gente”, ou “Prefiro plástico-bolha a pessoas”, ou “Meu cachorro é melhor que muita gente”. Afinal, todos temos aqueles dias em que preferimos a companhia de uma barra de chocolate do que de pessoas te cobrando coisas, te pedindo coisas, grosseiras, ou simplesmente pessoas que são, por natureza, irritantes. Não temos a obrigação de estar o tempo todo felizes e dispostos a interagir com outros seres humanos. E, na minha opinião, é até saudável reservar um tempinho, ainda que sejam apenas alguns minutinhos, de cada dia só para joguinhos bobos, doces ou os bichinhos que a gente gosta tanto. Ou até para rolar em cima de pedaço enorme de plástico-bolha  (já vi acontecer).
  Mas existem algumas pessoas que acabaram se decepcionando demais com a humanidade, e que resolveram que vão dedicar todo o seu afeto a seu pet, ou que almeja a solidão mais do que qualquer outra coisa. Porém, vale lembrar, nem mesmo a humanidade é “generalizável” (Não sei se essa palavra existe, mas se não existia, agora existe. Aceite.). É claro que algumas pessoas vão nos decepcionar e até mesmo tirar a nossa alegria por um tempo. E podemos até mesmo começar a acreditar que a maioria das pessoas é ruim, e que praticamente todas elas merecem o nosso desprezo. E sim, tem muita gente ruim lá fora. Eu mesma me choco com algumas coisas que vejo, de como seres humanos podem ser cruéis com quem não tem nenhuma defesa, gente ou bicho, seja com atos tão tão terríveis, ou palavras tão tão duras, ou com maldades sem propósito nenhum.
  Mas aí, Hey!, você se lembra que não existem só pessoas ruins no mundo. Se você olhar cuidadosamente, vai encontrar pessoas que nos mostram o que é ser gente de verdade. Afinal, quem nunca ouviu que precisava “virar gente”, né?! E talvez percebamos que virar gente seja mais do que apenas crescer, mas ter um grande coração, que ame antes de julgar, e que comporte mais pessoas do que mágoas, que enxergue mais qualidades do que defeitos. Virar gente envolve entender que nossas ideias nem sempre são as melhores, nossas escolhas nem sempre são as mais acertadas, e que, por mais que não entendamos naquele momento, nós estaremos errados em algum ponto, e que não há vergonha nenhuma em reconhecer. Porque gente também erra. E reconhece. E se desculpa.
  Se a gente se concentrar nas pessoas boas ao invés de pensar tanto em pessoas ruins, vamos encontrar gente que é tão tão gente.... Pessoas que ajudam outras pessoas, mais  fracas, tristes, e até perdidas, com um prato de comida, com uma palavra de conforto, com um abraço apertado. Gente que dá de si, e se coloca de lado para o maior conforto do outro. Que acarinha com o olhar,com o tom da voz. Gente que sabe a hora certa de dizer a coisa certa, que lê no nosso rosto um pedido de ajuda. Gente que acolhe gente que precisa, seja em casa, nos braços, no coração. Que perdoa, sem que a pessoa peça ou mereça, por entender que todos são imperfeitos, e que a próxima a errar talvez seja ela mesma. Que dedica toda a sua vida a ajudar o próximo, seja materialmente, seja espiritualmente, levando esperança, amor. Gente que entende que a vida do outro é tão importante quanto a sua, e que ele não precisa de tudo o que quer, e, portanto, pode dedicar-se a levar um pouquinho de felicidade a quem não tem nenhuma.
Olhando ainda mais cuidadosamente, talvez encontremos gente que seja gente antes de ser qualquer outra coisa. Que sejam gente, de forma tão ampla e completa, que tornam o significado da palavra “gente” ainda mais complexo. Pessoas que vivem para  o bem, para dar ainda que um pouco de consolo para quem sequer vai agradecer depois, mas que,por serem tão gente, se contentam com um sorriso de canto, um brilho no olho. São pessoas que dão aquilo que têm, ainda que precisem, para quem precisa mais.
  Toda essa “gente”, tão cheia de bondade e amor, são as pessoas que realmente precisamos observar, e são nelas que precisamos nos inspirar. A chave está na bondade, ou sincera vontade de ser bom pro outro. A capacidade de colocar o amor ao próximo acima de qualquer outro desejo que apareça no nosso coração. Um amor limpo, livre de qualquer influência que nossos olhos e ouvidos possam ter sobre ele. Um amor que não diminua ao ser testado, e que não desapareça por não ser correspondido. Que entenda que, mesmo ao ser retribuído com ódio ou ingratidão, fez o que devia, e sinta-se satisfeito.
  Ser gente requer sentimentos tão profundos e intensos que soa um tanto quanto impossível. Mas, pode-se ser gente, a meu ver, num gesto, numa palavra de carinho, em uma ou outra vez que sentimos um genuíno impulso de estender a mão a alguém, livre de qualquer intenção secundária.
  Ser gente o tempo todo, para nós seres humanos imperfeitos e falhos, é impossível. Mas agir como gente de vez em quando, quando surge a oportunidade, ou quando fazemos com que uma oportunidade apareça, já nos ajuda a ser apontados como “Aquela pessoa agiu como gente”. E garanto que não há chocolate, filhotinho fofo, ou plástico-bolha que nos traga uma sensação melhor do que essa.


*MaRi Rezk*